domingo, 26 de junho de 2011

————————————————————————————–
“Cristo era o único filho de Maria. Das entranhas de Maria, nenhuma criança além dEle. Os ‘irmãos’ significam realmente ‘primos’ aqui: a Sagrada Escritura e os judeus sempre chamaram os primos de ‘irmãos’.”
(Martinho Lutero, Sermões sobre João 1-4, 1534-39)
———————————————————————————-
“Maria é a mulher mais elevada e a pedra preciosa mais nobre no Cristianismo depois de Cristo… Ela é a nobreza, a sabedoria e a santidade personificadas. Nós não poderemos jamais honrá-la o bastante. Contudo, a honra e os louvores devem ser dados de tal forma que não ferem a Cristo nem às Escrituras.”
(Martinho Lutero, Sermão na Festa da Visitação em 1537.)

Palavras não traduzem

Padre José Fernandes de Oliveira
Como explicar nossos dogmas em palavras de fácil compreensão, se o próprio dogma não é?
1-Como explicar que cremos que só existe um Deus, mas ele é três pessoas divinas, Pai Santo, Filho Santo e Espírito Santo?
2-Como explicar que o Filho Santo que existia desde toda a eternidade sendo um só Deus com o Pai Santo e o Espírito Santo um dia se criou no ventre de uma virgem?

3- Como explicar que esta virgem Maria não criou Deus porque Deus é criador e não criatura, é criador e não criado?
4-Como explicar que o Filho Santo criou a si mesmo no ventre dela e ela, que era criada, ao dizer o seu sim, nem por isso se tornou criadora do Deus que a criara? Como explicar Jesus? Como explicar Maria e os santos?
5- Como explicar que gerar é mais o que criar, por isso o Filho é eternamente gerado, mas não é criado?
6-Como explicar que Maria recebeu o Filho Santo no ventre e que concebê-lo não foi um ato criador porque o Filho eterno já existia? No ato carnal homem e mulher, atendendo ao desejo e à vocação de procriar, geram uma vida, vinda do conteúdo de ambos. Maria não gerou Jesus por ato carnal. Assumiu e aceitou quem se gerava nela!
7- Como explicar esta fé a um descrente e, mais do que descrente, a um cético? E como explicar a outro cristão que entende como adoração a Maria o que é apenas um tributo de veneração especial à serva? Como provar a eles que não vemos Maria como deusa?
8-Como explicar a um católico confuso que chama corretamente Maria como mãe de Deus, mas prega que Maria “criou” Deus aqui na terra, que a palavra “criou” não traduz o que Maria realmente fez?
9-Como explicar a ele que “cuidadora” de Deus não é “criadora” de Deus?
10- Como explicar que Maria não é eterna a um piedoso fiel que a chama de “eterna mãe de Deus”? Com provar a ele que, como todos nós, ela já estava na eterna mente criadora de Deus como projeto, mas ela ainda não existia e que só Deus é eterno? Ter sido eternamente escolhida pelo Deus que transcende ao tempo não é o mesmo que existir desde toda a eternidade. Deus sempre existiu. Maria começou a existir. Jesus era o Filho de Deus que aceitou viver no tempo e, um dia, começou a existir aqui, mas só aqui, porque já existia como Filho em Deus desde todo o sempre.
12-Como explicar que o Filho Santo é o próprio Deus que também é Pai Santo e Espírito Santo e que quando falamos do Filho de Deus encarnado estamos falando do próprio e único Deus?
13- Como explicar que mesmo sendo um só e único Deus, o Filho não é o Pai, nem este é o Filho e nem o Espírito Santo é o Pai? Como orientar um cristão a não chamar Jesus de Pai e a não dizer, orando, que Nossa Senhora criou Deus neste mundo?
14-Como pedir ao irmão que no seu entusiasmo proclama Maria filha do Pai, mãe do Filho e esposa do Espírito Santo que explique o que acabou de dizer, já que Deus não tem filha unigênita, nem é marido e não tem esposa? O que tais palavras significam?
15-Como explicar a outras religiões que Deus esteve aqui por alguns anos, nasceu de mulher, viveu sua infância e adolescência no seio de uma família, mas era Deus que encarnado e humanado, agia no tempo?
16- Como explicar que Deus tem poder de se tornar humano por algum tempo, embora o humano não tenha o poder de se tornar Deus nem por um segundo?
E como se pode ser claro sobre estes temas? Nossas palavras são pobres. Não traduzem o que cremos e, se não tomarmos cuidado com os verbos e os vocábulos, deturpam a fé.
Por isso, prestemos atenção ao nosso catecismo. Se prestarmos, jamais diremos que Nossa Senhora é “medianeira de todas as graças” e, sim, medianeira “de” graças. Deus não nos dá todas as graças por meio de Maria, mas Maria ora conosco por toda e qualquer graça que pedirmos que ela peça conosco.
Não temos que orar a Maria antes de orar o Pai Nosso. Podemos pedir a ela e aos outros santos que orem conosco, mas, segundo Jesus, podemos e devemos falar diretamente com o Pai e com Ele, ou usar o nome dele. (Mt 18,19). A Bíblia fala de intercessores humanos, que oram pelos outros, mas diz também que o único intercessor com poder é Jesus. Mas, ele nos dá o direito de falar ao Pai em seu nome sem nem sequer falar direto com ele (Jo 16,23-26) Podemos ir diretamente ao Pai. Por isso ele manda no Pai Nosso orar ao Pai e chamá-lo de Pai Nosso. (Mt 6,9)
Os santos são intercessores convidados, mas não intercessores obrigatórios. Ninguém deve desprezar a cumplicidade da prece dos salvos em Jesus, mas ninguém tem que primeiro falar com eles e só depois falar com Deus. Também não se deve diminuir o valor da prece de alguém que já está no céu.
E quem nega que haja pessoas no céu não deve ter lido os trechos que mostram o Deus rico em misericórdia (Ef 2,4) e Jesus que tem todo o poder no céu e na terra, (Mt 28,18) anunciando que viria buscar e levar com ele quem morreu na sua graça. ( Jo 14,3) Uma coisa é a ressurreição do último dia da humanidade e outra a ressurreição de cada um que morre agora. Virei e vos levarei para mim mesmo, disse ele! As parábolas de Jesus dão a entender, principalmente a do mendigo Lázaro (Lc 16,22 ), que existe um encontro pessoal do indivíduo com Deus e que não temos que esperar até o fim dos tempos para entrar no céu.
Como explicar tudo isso a quem não tem nem mesmo um catecismo, ou tem, mas ainda não o leu? O problema número um da nossa igreja continua sendo o estudo da fé. Aceitamos testemunhar nossa fé, mas raramente aceitamos estudá-la e aprofundar nossos conhecimentos. Preferimos o rosário entre os dedos ao livro sobre a mão. Preferimos dedilhar as contas do rosário a folhear as páginas da Bíblia e do Catecismo Católico. Um dia, isso mudará, mas somente quando todos tiverem entendido que Jesus é para ser amado e estudado! Foi o que Paulo e Tiago disseram:
Mas vós não aprendestes assim a Cristo, (Efésios 4 : 20)
O que também aprendestes, e recebestes, e ouvistes, e vistes em mim, isso fazei; e o Deus de paz será convosco. (Filipenses 4 : 9)
E rogo-vos, irmãos, que noteis os que promovem dissensões e escândalos contra a doutrina que aprendestes; desviai-vos deles. (Romanos 16 : 17)
E que desde a tua meninice sabes as sagradas Escrituras, que podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus. (II Timóteo 3 : 15)
Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem. (I Timóteo 4 : 16)
Aquele, porém, que atenta bem para a lei perfeita da liberdade, e nisso persevera, não sendo ouvinte esquecidiço, mas fazedor da obra, este tal será bem-aventurado no seu feito. (Tiago 1 : 25)
Questione o pregador sem estudo, na próxima vez que alguém pregar que está expulsando o demônio da árvore genealógica de sua família; que você pode comungar Maria; que ela tem o mesmo DNA que Jesus; que o sangue de Cristo no cálice é o mesmo derramado na cruz; que Maria só mereceu ser mãe de Cristo porque era virgem pura porque Jesus não nasceria de mãe que tivesse tido outros filhos; ou que Maria deixou de ser virgem depois de conceber Jesus; ou que Deus fará milagres no domingo à tarde às 15 h; ou que foi demônio que apagou a luz no estádio onde todos oravam e que Jesus a acendeu; ou quando ouvir um pregador sequioso por milagres expulsar do Brasil o demônio da dengue com seus mosquitos; ou, ainda, quando ouvir alguém desfilando mais de 40 doenças que estão sendo curadas naquele momento pela televisão.
Não engula tudo como se fosse doutrina católica. Pode ser doutrina de um grupo, mas não da Igreja como um todo. Mais Bíblia e mais Catecismo com mais teologia podem mudar muita coisa na nossa Igreja. Já sabemos que a falta deles levou muita gente para fora de nós e nos deu muitos pregadores que não sabem do que estão falando.
O assunto é provocador e os primeiros a corrigir seus conhecimentos e suas palavras devem ser os sacerdotes. E eu me incluo. Se alguém achar erro no que preguei ou prego provoque-me e prove que eu errei. De bom grado pedirei desculpas e me corrigirei. Espero o mesmo daquele padre que ensinou que devemos invocar Maria e os santos após a comunhão porque somos incapazes de receber Jesus e falar com ele sozinhos. Trocou o “podemos” pelo “devemos”. A Igreja não nos obriga a invocar os santos toda vez que falarmos com Jesus. Naquele caso, o padre impôs ao povo sua devoção pessoal. Mas ele não foi ordenado para pregar o que sente e, sim, o que a Igreja ensina! Nem ele, nem eu, nem você!
Cuidemos com as palavras sobre Deus. Como diz o Padre Antonio Vieira no sermão da sexagésima há pregadores que pregam palavras de Deus, mas não a Palavra de Deus!
FONTE: Padre Zezinho, SCJ
Be the first to like this post.

Deixar uma Resposta

 

    segunda-feira, 13 de junho de 2011

    Catequese de Bento XVI sobre a oração – Intercessão de Moisés

    Praça de São Pedro
    Quarta-feira, 1º de junho de 2011

    Boletim da Sala de Imprensa da Santa Sé

    Queridos irmãos e irmãs,
    Lendo o Antigo Testamento, uma figura ressalta-se entre as outras: aquela de Moisés, exatamente como homem de oração. Moisés, o grande profeta e condutor no período do êxodo, desempenhou a sua função de mediador entre Deus e Israel fazendo-se portador, junto ao povo, das palavras e ordens divinas, conduzindo-o à liberdade da Terra Prometida, ensinando aos Israelitas a viver na obediência e na confiança a Deus durante uma longa permanência no deserto, mas também, e diria sobretudo, rezando. Ele reza pelo Faraó quando Deus, com as pragas, tentava converter o coração dos Egípcios (cf. Ex 8–10); pede ao Senhor a cura da irmã Maria, acometida pela lepra (cf. Nm 12,9-13), intercede pelo povo que havia se rebelado, amedrontado pelas ordens dos exploradores (cf. Nm 14,1-19), reza quando o fogo estava por devorar o acampamento (cf. Nm 11,1-2) e quando serpentes venenosas faziam um massacre (cf. Nm 21,4-9); dirige-se ao Senhor e reage protestando quando o peso da sua missão havia se tornado muito pesado (cf. Nm 11,10-15); vê Deus e fala com Ele “face a face, como alguém que fala com o próprio amigo” (cf. Ex 24,9-17; 33,7-23; 34,1-10.28-35).

    Também quando o povo, no Sinai, pede a Aarão para construir o bezerro de ouro, Moisés reza, explicando de modo emblemático a sua função de intercessor. O episódio é narrado no capítulo 32 do Livro do Êxodo e tem uma narração paralela em Deuteronômio no capítulo 9. É sobre esse episódio que gostaria de ater-me na Catequese de hoje, e em particular sobre a oração de Moisés que encontramos na narração do Êxodo. O povo de Israel encontrava-se aos pés do Sinai enquanto Moisés, sobre o monte, esperava o dom das tábuas da Lei, jejuando por quarenta dias e quarenta noites (cf. Ex 24,18; Dt 9,9). O número quarenta tem valor simbólico e significa a totalidade da experiência, enquanto com o jejum indica-se que a vida vem de Deus, é Ele que a sustenta. O ato de comer, de fato, implica assumir o alimento que nos sustenta; por isso, jejuar, renunciando ao alimento, nesse caso, tem um significado religioso: é um modo de indicar que não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca do Senhor (cf. Dt 8,3). Jejuando, Moisés mostra esperar o dom da Lei divina como fonte de vida: essa revela a vontade de Deus e nutre o coração do homem, fazendo-o entrar em uma aliança com o Altíssimo, que é fonte da vida, é a vida mesma.
    Mas, enquanto o Senhor, sobre o monte, dá a Moisés a Lei, aos pés do monte o povo a transgride. Incapazes de resistir à espera e à ausência do mediador, os Israelitas pedem a Aarão: “Faze-nos um deus que marche à nossa frente, porque esse Moisés, que nos tirou do Egito, não sabemos o que é feito dele” (Ex 32,1). Cansado de um caminho com um Deus invisível, agora que também Moisés, o mediador, desapareceu, o povo pede uma presença tangível, palpável, do Senhor, e encontra no bezerro de metal fundido feito por Aarão um deus tornado acessível, ao alcance do humano. É essa uma tentação constante no caminho de fé: contornar o mistério divino construindo um deus compreensível, correspondente aos próprios esquemas, aos próprios projetos. Aquilo que acontece no Sinai mostra toda a estupidez e a ilusória vaidade dessa pretensão porque, como ironicamente afirma o Salmo 106, “trocaram a sua glória pela estátua de um touro que come feno” (Sal 106, 20). Por isso o Senhor reage e ordena a Moisés que desça do monte, revelando-lhe o que o povo estava fazendo e terminando com essas palavras: “Agora, deixa, pois, que se acenda minha ira contra eles e os reduzirei a nada; mas de ti farei uma grande nação” (Ex 32,10). Como com Abraão a propósito de Sodoma e Gomorra, também agora Deus revela a Moisés o que pretende fazer, quase como que se não desejasse agir sem o seu consenso (cf. Am 3,7). Diz: “deixa que se acenda minha ira”. Na realidade, esse “deixa que se acenda minha ira” é dito exatamente para que Moisés intervenha e Lhe peça para não fazê-lo, revelando assim que o desejo de Deus é sempre de salvação. Como para as duas cidades dos tempos de Abraão, a punição e a destruição, em que se expressa a ira de Deus como rejeição do mal, indicam a gravidade do pecado cometido; ao mesmo tempo, o pedido do intercessor pretende manifestar a vontade de perdão do Senhor. Essa é a salvação de Deus, que implica misericórdia, mas ao mesmo tempo denuncia a verdade do pecado, do mal que existe, e assim deseja que o pecador, reconhecido e rejeitado o próprio mal, possa deixar-se perdoar e transformar por Deus. A oração de intercessão torna-se assim operante, dentro da realidade corrompida do homem pecador, a misericórdia divina, que encontra voz na súplica do orante e se faz presente através dele ali onde há necessidade de salvação.
    A súplica de Moisés está toda centrada sobre a fidelidade e a graça do Senhor. Ele refere-se primeiramente à história de redenção que Deus iniciou com a saída de Israel do Egito, para depois fazer memória da antiga promessa dada aos Padres. O Senhor operou a salvação libertando o seu povo da escravidão egípcia; para que agora – pergunta Moisés – “os egípcios dissessem: com um mau desígnio os levou, para matá-los nas montanhas e suprimi-los da face da terra!” (Ex 32,12). A obra de salvação iniciada deve ser completada; se Deus destruísse o seu povo, isso poderia ser interpretado como sinal de uma incapacidade divina de levar a cumprimento o projeto de salvação. Deus não pode permitir isso: Ele, o Senhor bom que salva, a garantia da vida, é o Deus de misericórdia e perdão, de libertação do pecado que mata. E, assim, Moisés apela a Deus, à vida interior de Deus contra a sentença exterior. Mas agora, argumenta Moisés com o Senhor, se os seus eleitos perecem, ainda que sejam culpáveis, Ele poderia parecer incapaz de vencer o pecado. E isso não se pode aceitar. Moisés fez a experiência concreta do Deus de salvação, foi enviado como mediador da libertação divina e então, com a sua oração, faz-se intérprete de uma dupla inquietação, preocupado com a sorte do seu povo, mas também preocupado com a honra que se deve ao Senhor, com a verdade do seu nome. A intercessão, de fato, deseja que o povo de Israel seja salvo, porque é o rebanho que lhe foi confiado, mas também para que naquela salvação se manifeste a verdade realidade de Deus. Amor pelos irmãos e amor por Deus se compenetram na oração de intercessão, são inseparáveis. Moisés, o intercessor, é o homem tensionado entre os dois amores, que na oração se sobrepõem em um único desejo de bem.
    Então, Moisés apela à fidelidade de Deus, remetendo-Lhe às suas promessas: “Lembrai-vos de Abraão, de Isaac e de Israel, vossos servos, aos quais jurastes por vós mesmo de tornar sua posteridade tão numerosa como as estrelas do céu e de dar aos seus descendentes essa terra de que falastes, como uma herança eterna” (Ex 32,13). Moisés faz memória da história fundadora das origens, dos Pais do povo e da sua eleição, totalmente gratuita, em que Deus somente havia tido a iniciativa. Não por motivo de seus méritos esses haviam recebido a promessa, mas pela livre escolha de Deus e pelo seu amor (cf. Dt 10,15). E agora, Moisés pede que o Senhor continue na fidelidade à sua história de eleição e salvação, perdoando o seu povo. O intercessor não se desculpa pelo pecado de seu povo, não elenca presuntos méritos nem do povo nem seus, mas apela à gratuidade de Deus: um Deus livre, totalmente, que não cessa de buscar aquele se distanciou, que se mantém sempre fiel a si mesmo e oferece ao pecador a possibilidade de voltar a Ele e de tornar-se, com o perdão, justo e capaz de fidelidade. Moisés pede que Deus mostre-se mais forte também que o pecado e a morte, e com a sua oração provoca esse revelar-se divino. Mediador de vida, o intercessor solidariza-se com o povo; desejoso somente da salvação que Deus mesmo deseja, ele renuncia à perspectiva de tornar-se um novo povo acolhido com prazer pelo Senhor. A frase que Deus lhe havia dito, “mas de ti farei uma grande nação”, não é sequer levada em consideração pelo “amigo” de Deus, que, ao contrário, está pronto a assumir sobre si não somente a culpa do seu povo, mas todas as suas consequências. Quando, depois da destruição do bezerro de ouro, voltar ao monte para pedir de novo a salvação para Israel, dirá ao Senhor: “Rogo-vos que lhes perdoeis agora esse pecado! Senão, apagai-me do livro que escrevestes” (v. 32). Com a oração, desejando o desejo de Deus, o intercessor entra sempre mais profundamente na consciência do Senhor e da sua misericórdia e torna-se capaz de um amor que chega até o dom total de si. Em Moisés, que está no topo do monte face a face com Deus e se faz intercessor para o seu povo e oferece a si mesmo – “apagai-me” –, os Padres da Igreja viram uma prefiguração de Cristo, que do alto da cruz realmente está diante de Deus, não somente como amigo, mas como Filho. E não somente se oferece – “apagai-me” –, mas com o seu coração transpassado se faz apagar, torna-se, como diz São Paulo mesmo, pecado, toma sobre si os nossos pecados para tornar-nos salvos; a sua intercessão não é somente de solidariedade, mas a identificação conosco: leva a todos nós no seu corpo. E assim toda a sua existência de homem e de Filho é clamor ao coração de Deus, é perdão, mas perdão que transforma e renova.
    Penso que devemos meditar essa realidade. Cristo está diante do rosto de Deus e reza por mim. A sua oração sobre a Cruz é contemporânea a todos os homens, contemporânea a mim: Ele reza por mim, sofreu e sofre por mim, se identificou comigo tomando o nosso corpo e a alma humana. E convida-nos a entrar nessa sua identidade, fazendo-nos um corpo, um espírito com Ele, porque do alto da Cruz Ele trouxe não novas leis, tábuas de pedra, mas a si mesmo, o seu corpo e o seu sangue, como nova aliança. Assim, faz-nos consanguíneos com Ele, identificados com Ele. Convida-nos a entrar nessa identificação, a estarmos unidos com Ele no nosso desejo de estar em um corpo, um espírito com Ele. Rezemos ao Senhor para que essa identificação transforme-nos, renove-nos, porque o perdão é renovação, é transformação.
    Gostaria de concluir essa catequese com as palavras do apóstolo Paulo aos cristãos de Roma: “Quem poderia acusar os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? Cristo Jesus, que morreu, ou melhor, que ressuscitou, que está à mão direita de Deus, é quem intercede por nós! Quem nos separará do amor de Cristo? […]nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados [...]nem outra qualquer criatura nos poderá apartar do amor que Deus nos testemunha em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8,33-35.38.39).
    Benedictus PP XVI
    Ao final da Catequese, o Papa dirigiu aos peregrinos de língua portuguesa a seguinte saudação:
    Amados peregrinos de língua portuguesa,
    a minha saudação amiga para todos, com menção especial das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição em festa pela recente beatificação da sua Madre Fundadora. Esta queria ver-vos todas unidas num mesmo e único pensamento: Deus. No pensamento e serviço de cada uma, o hóspede seja Deus; e, com Ele, a vossa vida não poderá deixar de ser feliz. Sobre vós, vossas comunidades e famílias desça a minha Bênção